sexta-feira, 27 de agosto de 2010

I'm too sad to tell you, Bas Jan Ader

I'm too sad to tell you, Bas Jan Ader

A começar pelo título. É uma tristeza absoluta, não nomeada, que leva o homem à impossibilidade de falar. Mas falar, neste filme, não é preciso. Como parece ser comum nos filmes de videoarte produzidos na década de 1970, I’m too sad to tell you é um tanto infantil, e também catártico. (Há quantos anos não choro assim, tão livremente, tão tristemente. Parece que até a tristeza está invadida por uma onda de racionalidade que desejo imprimir em mim, levando a infância, a adolescência e certa infantilidade que tenha ficado. Racionalidade talvez muito irracional e desesperada. Espero que seja um caminho com volta. Agora mesmo.) Apesar do título – I’m too sad to tell you, Estou muito triste para falar –, o vídeo não é dramático. É nu. Não tem som, a luz ressalta o contraste claro/escuro explorado. É a blusa cacharel preta, o rosto branco; a boca, por dentro, escura, o fundo claro. Essas são as cores do filme. O rosto do homem é parcialmente iluminado, ou parcialmente sombreado. O lado esquerdo é aquele que se vê mais claramente, o mais exposto, o evidente. O homem é uma criança, ele chora como uma criança. Mexe nervosamente nos cabelos, escancara a boca, se acaricia, soluça, o nariz escorre. Mas as linhas que contornam a sua boca denunciam maturidade, literalmente desgaste corporal (“e cada abraço tece além do braço/ a teia de problemas que existir/ na pele do existente vai gravando.”, C.D.A.). E mais ainda: os olhos baixos do homem que chora. Ele não encara a câmera. Ao contrário, somos nós que o encaramos, esperando alguma coisa indefinida, tão incerta quanto o próprio filme. O que se espera deste filme? Parece que é a nós que o homem tenta dizer não se sabe o quê.

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A coleção de verão da Ecletic está bonita. As rendas estão absolutamente irresistíveis: blusas, vestidos, leggings. Nos tons branco, gelo, nude, salmão e preto. Conheço a Ecletic desde 2000; desde quando me dei conta de que meninas podiam usar saia e vestido. Até então, eu só escolhia como opção indumentária uma calça bailarina preta. Mas há bastante tempo a Ecletic não me emocionava. Tudo muito pasteurizado, sem graça, sem charme. Tanto que entrei na loja hoje porque reparei numa de minhas colegas de classe um short jeans cintura alta lindo e desejável. Conviver com mulheres é muito bom, principalmente numa faculdade de moda/arte. Fica evidente em cada uma certa autenticidade. Mas mais interessante do que as roupas, é observar o modo como as meninas (eu não me sinto mais menina, por isso esse referente distante “as meninas”) se comportam em seus corpos. Pernas grossas e finas, barriga, celulite, canelas impecáveis, peles lindas ou marcadas, as paletas de cores das unhas, cabelos, milhares de cabelos diferentes: e elas não temem. De alguns anos até hoje meu corpo está cada vez mais coberto. E mais escuro e neutro. Escondo meu corpo, tenho vergonha dele. Com o calor agora esticando os braços me dei conta de que quase não tenho mais saias. E definitivamente não encontrei bermudas e shorts no meu armário. Por isso entrei na Ecletic e comprei o short jeans cintura alta lindo igual ao da minha amiga de classe. (E mais duas saias curtas – cintura alta, sempre –, uma roxa outra rosa, sim!, na My philosophy, com 50% de desconto.) Observar o outro é sempre um ótimo exercício de aproximação da realidade.

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Sempre repito que gostaria de ter tido a cabeça de hoje quando entrei no meu primeiro curso de graduação, em agosto de 2001. O corpo, logicamente, também era outro. E é com tanta simplicidade que as meninas da minha sala não têm 27 anos, mas 18 ou 20, que me movo a resgatar meu corpo de certo castigo a que o impus.

26.viii.2010