domingo, 20 de setembro de 2009

Os dentes

É difícil escrever. Nestes dias assim corridos, falta-me inclusive o ar. É difícil, falta-me o ar. Nem a janela aberta. O peito oprime pulso e coração, e daqui o relógio não para, o sangue muito menos, os ônibus estão cada vez mais rápidos. É assustador. Os homens apontam os ônibus, fazem sinal. Há tantos poemas perdidos no espaço. Mas, ainda, é difícil escrever. A figura de um homem, os quatro dentes da frente - sujos, os dentes - formam uma barreira, o muro de Berlim. E neste dia de paz religiosa posso dizer, com toda a liberdade, que é um demônio, um capeta, ah, com os dentes a me atormentar. Mas eu quero. Os braços, os dentes, as unhas e os chifres deste ser das trevas iluminado. O ar, falta-me o ar. Com isso, é difícil que se estabaleça uma conversa normal, humana, inteligente. O homem, chato e depravado; eu, também. É difícil escrever sem ar. Inspira, expira; é um pássaro, um corpo, um avião. O ar.


20.ix.09